
PRESENTE DE NATAL
Na obra Meu Pé de Laranja Lima, de José Mauro de Vanconcelos, o menino Zezé, de seis anos, trabalha como engraxate para comprar um presente para o pai que se encontrava desempregado e não fora capaz de lhe dar o presente tão aguardado. Sempre que pego este livro, recolho-me para lê-lo longe de outros olhares que me cercam. É difícil conter as lágrimas ao se deparar com as aventuras e desventuras do personagem principal. Quem tem ou teve infância vivida na pobreza, imediatamente se vê representado(a) ali onde falta tudo. Ensimesmada, fico a analisar o quão é injusto voltar as celebrações desta data para a tão aclamada troca de presentes quando o sentido real é o de festejar o nascimento de Jesus que deveria acontecer todos os dias. Senão vejamos: são 364 dias do ano de dureza de vida. Sem alimento, sem escola boa, sem saúde, trabalho desde cedo e ter somente o 25 de dezembro para receber, na maioria das vezes, um mimo dos que lhes tem pouco afeto é, simplesmente, uma agressão. No decorrer do ano, as mesmas pessoas que se propõem a dar presente na data natalina são as mesmas que viram as costas quando abordadas para dar uma ajuda em dias corriqueiros. Assim fica difícil entender a humanidade. Outro dia, ao conversar com uma senhora, ela salientou que os deuses já lavaram as mãos em relação ao povo daqui de baixo. Vivemos em tempos de retorno aos primórdios. Cada um(a) que cuide de seu bem viver. Violência grassa por toda a parte, dentro e fora das famílias. Vivemos um caos e, aparentemente, o povo nem se dá conta. Pais matam filhos, filhos matam pais, crianças portam fuzis, políticos, justiça e correlatos (esses? nem se fala) continuam a praticar desmantelos que desbancam qualquer malfeitor da vida fictícia ou real. Em uma passagem do livro “O Elogio da Loucura”, Erasmo de Roterdã diz que os deuses se divertem bastante com as peripécias feitas pelos humanos aqui na Terra. Acredito que não seja mais divertido ver tantas injustiças, baboseiras e crueldades feitas pelos humanos. Agora, com certeza, os deuses estão preocupados e, talvez, chorem, chorem muito, visto que nem no Natal está dando para ser feliz.
Uma advertência: Natal não é só dia vinte e cinco de dezembro. Natal é todo dia. Se possível, celebremos!